22/04/2014 16h24
Deus n?o trocar? a ?gua do nosso aqu?rio
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Os dois mais prósperos estados do Brasil, São Paulo e Rio de Janeiro, vivem uma batalha por água. O estado paulista, que assiste impotente ao colapso dos reservatórios do Sistema Cantareira, responsável pelo abastecimento de 8,8 milhões de pessoas, planeja captar água na bacia Paraíba do Sul, fonte hídrica para 11 milhões de fluminenses. O Rio de Janeiro alega que o manancial já está sobrecarregadoe que os 5 mil litros de água por segundo desejados pelo estado vizinho colocariam em risco o abastecimento.</p>
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Disputas à parte, a situação merece ser analisada sob a ótica da perplexidade: como um país que detém 13% da água doce disponível no planeta, índice que o coroa como a maior caixa d’água da Terra, chega a tal situação? Apesar de as autoridades se ancorarem em fenômenos climáticos para justificar a crise de abastecimento, o problema é mais amplo e decorre de uma miríade de fatores provocados pela má gestão dos recursos hídricos.</p>
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Em 2014, a Organização das Nações Unidas (ONU) elegeu “Água e Energia” como tema do Dia Mundial da Água, comemorado em 22 de março. Cabe acrescentar que o Brasil, país cuja matriz elétrica tem 85% de participação hídrica, também vive momentos de tormenta nesse campo. Os reservatórios das hidrelétricas do Sudeste e Centro-Oeste, que respondem por 70% da energia consumida pelos brasileiros, estão com níveis de armazenamento de aproximadamente 40%. Em fevereiro, o índice chegou a 34%, o pior desde 2001, ano do famigerado racionamento de energia.</p>
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Segundo a ONU, em 2030, a população do planeta aumentará em 40% a demanda por água, em 35% a demanda por alimentos e em 50% a demanda por energia. Hoje, 768 milhões de pessoas no planeta não têm acesso à água potável. A catástrofe faz com que duas mil crianças menores de cinco anos morram diariamente devido a doenças de veiculação hídrica. A humanidade não tem o que comemorar.</p>
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No Brasil a situação é alarmante. Constata-se que o país agraciado com tamanha riqueza não sabe, ou não quer, cuidar de suas reservas. De acordo com o Instituto Trata Brasil, somente nas 100 maiores cidades brasileiras são lançadas, por dia, 3,5 piscinas olímpicas de esgoto na natureza, o que significa quase nove milhões de litros de poluição descarregados diretamente em nossos córregos, rios e lagos a cada 24 horas.</p>
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Ainda segundo o Trata Brasil, cerca de 40% de toda a água tratada no país é desperdiçada no caminho entre a produção e os consumidores. As causas para tamanho absurdo envolvem falta de investimentos, uso de tecnologias defasadas e manutenções precárias e ineficientes nas redes de distribuição, dentre outros. Quem nunca presenciou a água jorrar pelas ruas por horas, às vezes dias, sem que ninguém aparecesse para reparar o problema?</p>
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A escassez de água já é um problema real, no Brasil e no mundo. A cobrança por atitudes mais sustentáveis deve recair sobre todos os organismos da sociedade, governos, empresas e cidadãos. Insistir no pensamento de que a água é um elemento inesgotável significa assinar a própria sentença de morte. Nós temos o dever de cambiar a maneira como lidamos com os recursos hídricos. Inclusive, e principalmente, abandonar a ideia de que a água é barata e, portanto, pode ser desperdiçada sem maiores consequências econômicas.</p>
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Andamos no fio da navalha. A irrigação de lavouras responde por 72% da vazão consumida no Brasil, algo em torno de 2,3 milhões de litros de água por segundo. A dessedentação animal vem em seguida, com 11%, à frente dos usos urbano (9%) e industrial (7%), segundo dados da Agência Nacional de Águas (ANA). A partir das informações podemos constatar que, ironicamente, é provável que a escassez de água nos mate primeiro de fome.</p>
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Fiemo-nos em Mário Quintana, que certa vez disse: “Para os peixinhos do aquário, quem troca a água é Deus.” Pois nós, peixinhos desse imenso aquário alcunhado Terra, temos de acordar e perceber que Deus já fez sua parte. Agora, a batalha é nossa.</p>