Bom Dia - O Diário do Médio Piracicaba

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08/03/2016 09h57

Este n?o ? um texto sobre o Dia da Mulher

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<p> Chega o 8 de mar&ccedil;o e d&aacute; para se sentir como no filme O Feiti&ccedil;o do Tempo, aquele com o Bill Murray: ficamos presas a um inescap&aacute;vel Dia da Marmota, que se repete vezes sem fim, em uma esp&eacute;cie de bug na malha c&oacute;smica do tempo.</p> <p> A diferen&ccedil;a &eacute; que se trata de um mesmo dia que se repete mais ou menos da mesma forma todos os anos. Voc&ecirc; deve ter ideia do roteiro:</p> <p> Homenagens toscas que ignoram completamente o significado pol&iacute;tico da data, mensagens de como somos lindas e multitarefas, congratula&ccedil;&otilde;es vazias (&ldquo;parab&eacute;ns&rdquo; e &ldquo;feliz dia&rdquo; exatamente pelo qu&ecirc;? N&atilde;o &eacute; como se fosse anivers&aacute;rio ou Natal, minha gente), e, por outro lado, a luta para lembrar que n&atilde;o existimos para ser enfeite, que h&aacute; reivindica&ccedil;&otilde;es importantes, e sobre como ganhar flores n&atilde;o resolve os problemas de viol&ecirc;ncia, de falta de oportunidades e de direitos.</p> <p> Mas este texto n&atilde;o &eacute; sobre isso. Porque isso j&aacute; foi falado &ndash; todos os anos, sempre como se fosse a primeira vez. E sempre surge a necessidade de repetir. Olha a&iacute; a maldi&ccedil;&atilde;o do Dia da Marmota outra vez.</p> <p> No filme, o personagem de Bill Murray tem pelo menos a chance de agir e falar de outra maneira quando o dia se repete. Do lado de c&aacute;, estamos predestinadas a repetir as mesmas falas todo ano. Se &eacute; preciso repetir tanto, pode ser porque n&atilde;o ouvem. Ou porque n&atilde;o querem que a gente fale de outra coisa?</p> <p> &Agrave;s vezes at&eacute; querem que a gente fale, com data certa, espa&ccedil;o reservado, tema definido. E ficou decidido que o momento para isso seria o Dia da Mulher. Claro, &eacute; maravilhoso aproveitar esse dia para trazer mais visibilidade para os temas importantes para as mulheres (que s&atilde;o de import&acirc;ncia para toda a sociedade). Mas existem outros 11 meses e um monte de assuntos que podemos tratar.</p> <p> Pode ser muito louco isso, mas tamb&eacute;m existimos em dias que n&atilde;o s&atilde;o 8 de mar&ccedil;o. Ou, pelo menos, tentamos existir.</p> <p> Ent&atilde;o n&atilde;o me levem a mal, mas acho necess&aacute;rio levantar essa provoca&ccedil;&atilde;o. Um chamado, talvez? A quem trabalha na m&iacute;dia, aos jornalistas, organizadores de eventos, patrocinadores. E tamb&eacute;m a quem consome os conte&uacute;dos que essas empresas produzem. A voc&ecirc;, que l&ecirc;.</p> <p> Em que assuntos, em que lugares e em quais momentos a opini&atilde;o das mulheres &eacute; levada em conta? Por que o interesse pela opini&atilde;o e pelo trabalho das mulheres parece &ldquo;esfriar&rdquo; depois que passa o Dia da Mulher? S&oacute; servimos para falar sobre o que tem &ldquo;mulher&rdquo; no meio?</p> <p> N&atilde;o precisaria lembrar isso, mas as mulheres t&ecirc;m um bocado de coisas para dizer, nos mais diversos assuntos. Mulheres podem falar sobre games, economia, pol&iacute;tica, literatura, cinema, esportes, ci&ecirc;ncias. Sobre tudo o que voc&ecirc; imaginar. Com uma baita propriedade.</p> <p> S&atilde;o assuntos que n&atilde;o t&ecirc;m data, que podem ser discutidos o ano inteiro &ndash; e mulheres podem fazer parte dessas discuss&otilde;es todas as vezes. Sim, &eacute; incr&iacute;vel, mulheres com opini&atilde;o existem o ano inteiro; n&atilde;o s&atilde;o criaturas m&aacute;gicas que brotam da terra apenas na proximidade do Dia da Mulher.</p> <p> Temos muito o que falar, mas alguns acham que ouvir nossa voz &eacute; nos impor assuntos. Temos que falar disso, porque d&aacute; audi&ecirc;ncia; temos que falar daquilo, porque &eacute; o que querem ouvir. Mas e se quisermos falar sobre outros temas? At&eacute; onde vai a liberdade de express&atilde;o se nossa voz s&oacute; tem espa&ccedil;o at&eacute; onde nos deixam ter?</p> <p> O problema, espero que entendam, n&atilde;o &eacute; a aten&ccedil;&atilde;o que as mulheres e suas quest&otilde;es recebem em fun&ccedil;&atilde;o desta data, tristemente necess&aacute;ria, se ainda precisamos brigar para existir; o problema &eacute; quando &eacute; um interesse com hora marcada para acabar.</p> <p> O lado bom &eacute; que mar&ccedil;o est&aacute; bem no in&iacute;cio do calend&aacute;rio, o que permite come&ccedil;ar, agora, um compromisso com um cen&aacute;rio de mais oportunidades para as mulheres. O trabalho e a opini&atilde;o das mulheres podem estar em evid&ecirc;ncia todos os meses, porque estamos a&iacute;, pesquisando e produzindo e criando sem tr&eacute;gua.</p> <p> Quero me acostumar a ver mais mulheres em espa&ccedil;os e assuntos que, por serem considerados de &ldquo;interesse geral&rdquo;, normalmente ganham porta-vozes ou debatedores masculinos &ndash; refor&ccedil;ando o poder que o homem tem de ser o g&ecirc;nero &ldquo;neutro&rdquo;.</p> <p> Quero me acostumar a ver mais diversidade de mulheres na m&iacute;dia e na produ&ccedil;&atilde;o cultural, mulheres de outras realidades, diferentes de mim e que n&atilde;o t&ecirc;m as mesmas opini&otilde;es que as minhas, para quebrar a ideia de que uma mulher &eacute; o suficiente para representar a totalidade do g&ecirc;nero em determinado debate, como se f&ocirc;ssemos todas iguais.</p> <p> Entendo que essa quest&atilde;o parece algo m&iacute;nimo, uma lasca de unha, perto dos problemas que o Dia da Mulher surgiu para questionar e combater. Mas a quest&atilde;o do direito &agrave; voz e de ser ouvida n&atilde;o deixa de ser importante. A voz &eacute; parte de n&oacute;s. E tamb&eacute;m &eacute; nosso direito decidir o que fazer com ela.</p> <p> Se o t&iacute;tulo do texto pareceu enganoso, explico: realmente n&atilde;o &eacute; um texto sobre o Dia da Mulher; afinal, eu o escrevi pensando nos outros. Um &uacute;nico dia, por mais que se repita feito feiti&ccedil;o em filme reprisado &agrave; exaust&atilde;o na Sess&atilde;o da Tarde, n&atilde;o &eacute; o suficiente para nele caber tudo o que temos para dizer. Um dia n&atilde;o &eacute; o suficiente. Precisamos do calend&aacute;rio inteiro.</p> <p style="text-align: right;"> <em>por Aline Valek</em></p> <div id="cke_pastebin"> <div style="text-align: right;"> &nbsp;</div> </div>

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