Bom Dia - O Diário do Médio Piracicaba

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23/11/2015 21h30

Dia dos rios: salve o Rio Doce!

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<p> &nbsp;* Cl&aacute;udio B. Guerra</p> <p> 24 de novembro &eacute; o dia dos Rios, que s&atilde;o elementos vitais na experi&ecirc;ncia humana. Eles t&ecirc;m guiado e alimentado v&aacute;rias civiliza&ccedil;&otilde;es, como &eacute; o caso do Nilo, na &Aacute;frica, Tigres e Eufrates, no Oriente M&eacute;dio.</p> <p> No Brasil, nossa rica hidrografia conta com in&uacute;meros grandes rios como o Amazonas, Paran&aacute;, Paraguai, S&atilde;o Francisco, Para&iacute;ba do Sul, Jequitinhonha, Doce, e tamb&eacute;m com milh&otilde;es de pequenos ribeir&otilde;es, formando um sistema h&iacute;drico de grande import&acirc;ncia hist&oacute;rica, econ&ocirc;mica, social e ambiental.</p> <p> Vale lembrar que um rio n&atilde;o &eacute; apenas um curso d&aacute;gua ou uma linha azul no mapa. Um rio &eacute; um ser vivo complexo, onde tudo acontece de forma equilibrada, devido a uma harmoniosa rela&ccedil;&atilde;o com os solos, a atmosfera, a vegeta&ccedil;&atilde;o e os seres vivos. Suas curvas, seu leito, suas margens com florestas e plan&iacute;cies de alaga&ccedil;&atilde;o, seu fundo misterioso onde vivem milh&otilde;es de seres vivos, tudo funciona dentro da l&oacute;gica da natureza. O rio &eacute; tamb&eacute;m sin&ocirc;nimo de for&ccedil;a, beleza, energia e fertilidade. Ele d&aacute; suporte &agrave; vida e a transporta. A biodiversidade e a pesca s&atilde;o d&aacute;divas do rio.</p> <p> O conceito moderno de rio abrange tamb&eacute;m a intera&ccedil;&atilde;o din&acirc;mica no seu territ&oacute;rio entre &aacute;gua, terra, gente, trabalho, desenvolvimento, hist&oacute;ria e cultura. Aqui lembramos do Rio Doce, elemento natural vital para 228 munic&iacute;pios, abrangendo cerca de 3,5&nbsp; milh&otilde;es de pessoas em Minas Gerais e no Esp&iacute;rito Santo.</p> <p> O Rio Doce faz a liga&ccedil;&atilde;o entre as v&aacute;rias regi&otilde;es, economias, e pessoas dentro da sua bacia hidrogr&aacute;fica. Assim, ele e seus afluentes Piranga, Piracicaba, Santo Ant&ocirc;nio, Caratinga, Sua&ccedil;ui, Manhua&ccedil;u, etc se mant&ecirc;mvivos pelo princ&iacute;pio da solidariedade das &aacute;guas. Uns doam &aacute;guas para os outros.</p> <p> No seu caminho para o mar, o Doce passa por montanhas, vales, florestas, cidades, fazendas, f&aacute;bricas, at&eacute; chegar ao destino final. Suas &aacute;guas servem para o abastecimento humano e industrial, agricultura e pecu&aacute;ria, pesca, lazer, gera&ccedil;&atilde;o de energia el&eacute;trica, movendo a economia, o desenvolvimento e a qualidade de vida das pessoas. Al&eacute;m disso, recebe e leva para o mar muitos rejeitos dom&eacute;sticos e industriais. Cerca de 40 cidades da regi&atilde;o cresceram acompanhando o Doce, que as acolheu e marca seu dia-a-dia.</p> <p> O rompimento das barragens da SAMARCO gerou um tsunami de lama que atingiu o leito do Doce e foi desaguar no Oceano Atl&acirc;ntico, 850 km depois. Os efeitos negativos deste tsunami sobre o rio, sua biodiversidade, solos, matas ciliares e tamb&eacute;m sobre as atividades econ&ocirc;micas, principalmente na &aacute;rea de servi&ccedil;os nas cidades e na agropecu&aacute;ria s&atilde;o absolutamente catastr&oacute;ficos. No mar, outra trag&eacute;dia ambiental acontece, pois aquele &eacute; um ecossistema extremamente rico e fr&aacute;gil.</p> <p> O site dispon&iacute;vel na internet e o marketing da mineradora asseguram que o n&iacute;vel de comprometimento dela com a sustentabilidade e responsabilidade social eram de alto n&iacute;vel. A pr&aacute;tica mostrou o contr&aacute;rio.</p> <p> Gastaremos d&eacute;cadas de trabalho para recuperar o rio e esta tarefa gigantesca n&atilde;o pode ser realizada com dinheiro p&uacute;blico, uma vez que pela Lei 9.605 de Crimes Ambientais claramente existe um respons&aacute;vel pela trag&eacute;dia ambiental e pela morte de 23 pessoas, al&eacute;m da perdas materiais e imateriais totais de quase 800 outras, que simplesmente n&atilde;o t&ecirc;m mais suas refer&ecirc;ncias de vida.</p> <p> Passadas as posturas oportunistas dos governantes (presidente da rep&uacute;blica, governadores, ministros, deputados, senadores, etc) e o sil&ecirc;ncio abissal da mineradora, fica a d&uacute;vida se daqui a algumas semanas surgir&atilde;o outros temas mais &ldquo;quentes&rdquo; na m&iacute;dia e tudo se arrastar&aacute; vagarosamente pelo esquecimento.</p> <p> A dire&ccedil;&atilde;o da SAMARCO n&atilde;o assimilou a magnitude da trag&eacute;dia, n&atilde;o reagiu e n&atilde;o apresentou um plano de emerg&ecirc;ncia, transferindo todas as conseq&uuml;&ecirc;ncias da maior trag&eacute;dia socioambiental do pa&iacute;s para as sociedades e governos de Minas e do Esp&iacute;rito Santo.</p> <p> Ao que parece, sua estrat&eacute;gia &eacute; ficar quieta, n&atilde;o polemizar, dar tempo ao tempo, que o departamento jur&iacute;dico vai arrumar v&aacute;rias brechas para a situa&ccedil;&atilde;o ficar sob controle. &Eacute; nisto que a SAMARCO, VALE e BHP est&atilde;o apostando..Enquanto isto, &eacute; bom criar um Fundo de recupera&ccedil;&atilde;o do rio, numa a&ccedil;&atilde;o entre amigos, num esquema do &ldquo;business as usual&rdquo;. Assim, a iniciativa do fot&oacute;grafo Sebasti&atilde;o Salgado &eacute; louv&aacute;vel, mas j&aacute; enfrenta severas cr&iacute;ticas nas redes sociais, por suas conhecidas rela&ccedil;&otilde;es comerciais com a VALE. Neste momento, este Fundo parece um arranjo para ajeitar as coisas.</p> <p> Ressalta-se que o Salgado e o Instituto Terra seriam bem vindos a participar de um Grupo Gestor formado por Minist&eacute;rio P&uacute;blico, Comit&ecirc;s de Bacias Hidrogr&aacute;ficas, Prefeituras, &oacute;rg&atilde;os p&uacute;blicos federais e estaduais (at&eacute; ent&atilde;o inoperantes no controle de barragens) e tamb&eacute;m a pr&oacute;pria SAMARCO. Quem destruiu, obrigatoriamente, tem de ajudar a reconstruir!</p> <p> Este Grupo Gestor &eacute; quem deveria liderar o desenvolvimento e gest&atilde;o do Plano de Recupera&ccedil;&atilde;o do Rio Doce, j&aacute; que os governos, nos seus diferentes n&iacute;veis est&atilde;o completamente desacreditados pela popula&ccedil;&atilde;o, depois de tantos erros, omiss&otilde;es, descaso, indiferen&ccedil;a e incompet&ecirc;ncia. A gest&atilde;o do Plano deve ser tarefa conjunta e, necessariamente, garantir a participa&ccedil;&atilde;o das entidades da sociedade civil e transpar&ecirc;ncia nas a&ccedil;&otilde;es e aplica&ccedil;&atilde;o dos recursos privados, vindos da SAMARCO.</p> <p> Por outro lado, dada a gravidade da situa&ccedil;&atilde;o, precisamos criar uma Comiss&atilde;o da Verdade sobre as Barragens em Minas Gerais, com a garantia de participa&ccedil;&atilde;o de pelo menos 40% de representantes das entidades da sociedade civil, atrav&eacute;s de auditores independentes.</p> <p> Concluindo, cabem 3 perguntas:</p> <p> 1. &nbsp;A grande mineradora n&atilde;o teria algo a dizer &agrave;s fam&iacute;lias dizimadas de Bento Rodrigues e Paracatu, &agrave; sociedade regional e a cerca de 800 mil pessoas atingidas diretamente pela trag&eacute;dia socioecon&ocirc;mica e ambiental? Ou ela acha que pedir desculpas no Programa Fant&aacute;stico da Rede Globo &eacute; suficiente?</p> <p> 2. &nbsp;17 dias ap&oacute;s a maior trag&eacute;dia s&oacute;cio ambiental do pa&iacute;s, a Secretaria Estadual do Meio Ambiente de Minas Gerais e a FEAM n&atilde;o t&ecirc;m nada a declarar?</p> <p> 3. O cen&aacute;rio &eacute; triste e o Rio agoniza. Quanto vale o Rio Doce, monetariamente?</p> <p> &nbsp;</p> <p> <em>* Claudio B. Guerra &eacute; engenheiro graduado pela UFMG, com mestrado em recursos h&iacute;dricos no UNESCO-IHE: Institute for Water Education, em Delft, Holanda. Em 2000, ocupou o cargo de Secret&aacute;rio Adjunto de Meio Ambiente do Governo de Minas.&nbsp;</em><em>Trabalhou cerca de 20 anos na bacia do Rio Doce e tem v&aacute;rios livros, publica&ccedil;&otilde;es e artigos sobre a realidade socioecon&ocirc;mica e ambiental daquela regi&atilde;o.</em></p>

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